sábado, 11 de junho de 2016

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Uma segunda ronda com Rosamundo Lupton depois da desistência perante o Irmã que continua a ser explorado na capa deste seu mais recente livro, não só sendo citado, também levando a um design quase idêntico.
Nenhum problema de consciência perante a decisão de então, apenas uma interrogação sobre a possibilidade de evolução.
Desta vez foi possível passar para lá de umas poucas páginas pois apesar da escrita não ter elementos que mereçam elogios, pelo menos já não depende das marcas para ter tentar ter personalidade.
Pelo contrário, até é através da reprodução de uma conta de Twitter que a autora consegue os (breves) momentos entusiasmantes pela exploração de como as palavras são entendidas pelos sentidos.
Essa é a conta de Twitter de uma menina surda que acompanha a sua mãe ao longo da trama e que é a muleta do livro.
Pertence-lhe a ela o ponto de vista na primeira pessoa - e, portanto, a única voz distinta - que interrompe a omnisciência do narrador.
Ainda assim uma voz pouco coerente, ao serviço das necessidades da escritora e não do próprio personagem.
A miúda de dez anos que, apesar de surda, está numa turma de sobredotados, ora analisa o mundo com uma maturidade de quem caminha rapidamente para os seus dezoito anos, como mostra estados de euforia ou receio em que se manifesta como não tendo ainda chegado ao seu sexto aniversário.
Ainda assim esta opção - como a própria presença da miúda, injustificada - é a que dá algum traço de personalidade a um livro que se alonga demais em elementos supérfluos que o impedem de criar o envolvimento de que necessita.
Não se assumindo, desde o início, como um thriller, o livro precisa que o leitor esteja investido emocionalmente para superar as muitas implausibilidades de que este faz uso.
Nada menos do que acreditar que uma mulher sem experiência consegue conduzir um camião em estradas geladas porque o seu curso de Astrofísica lhe permite compreender o funcionamento da máquina.
Ou que ela levaria a sua filha para tão perigoso ambiente quando vai em busca do marido movida por um pressentimento, ainda que a polícia o dê como presumivelmente morto.
Tudo numa escalada de drama doméstico que se resume como o de uma mãe de uma menina surda que, com medo de que esta tenha de crescer sem pai, parte para resgatar o marido que a tinha abandonado por uma mulher Inupiat.
O livro trata do percurso da mulher em direcção ao local onde o marido estava, dando tempo para explorar a sua relação com a filha e os medos mútuos, além do universo interno da rapariga.
Como isto é pouco interessante, a meio do livro a autora tem de lançar algum perigo que acrescente interesse à situação linear de um personagem a caminho de outro.
Lupton muda a estratégia e leva o drama para caminhos de algo que só com boa vontade se pode chamar suspense, adicionando elementos para lá do interior da cabine do camião.
Por um lado conseguindo ligar o portátil da filha à internet - do interior do camião que se encontra numa região isolada - e, a partir dessa situação, criar uma figura misteriosa que envia emails perturbadores.
Por outro demonstrando um medo da mãe em torno das luzes de camiões que se cruzam com o dela e que poderão estar a segui-las.
Neste momento a autora aponta ao thriller de forma artificial, usando de uma paranóia injustificada para tentar ligar o email bizarro e a suposta perseguição.
Foi esta estratégia ridícula para relançar o livro quando ele já vai a meio, mudando-lhe o tom, que levou à desistência.
Um resultado em tudo igual ao do primeiro livro de Lupton, por motivos diferentes. Embora no limite se possa dizer que a causa é, agora como então, a falta de qualidade da autora.
Larguei-o sem qualquer preocupação de saber o que acontece no final do livro, embora desconfie que seja relativamente fácil de concluir.
Afinal a autora tentou de forma pontual, por via de entrevistas de rádio e discussões em bares de camionistas, introduzir um vilão anónimo: as empresas que se dedicam ao fracking.
Apesar de serem conversas em "pano de fundo", a sua introdução é o contrário de discreta, pelo que me parece uma aposta relativamente segura dizer que a culpa do incêndio que terá morto o marido da protagonista foi causado por uma destas empresas (acidental ou propositado, tanto faz).
Marido que, obviamente, não está morto. Seria imoral que a autora deixasse uma criança surda orfã de pai!
Como ele é um fotógrafo para publicações sobre vida selvagem, terá obtido fotos dos crimes ambientais destas empresas e fingido a sua morte para se sentir seguro.
Seja ou não este ridículo enredo o que o livro seguiu depois da página cento e cinquenta, não há final capaz de compensar o tempo que se perde com Rosamund Lupton.
Da minha parte não voltarei a colocar-me na situação em que tenho de me livrar de um livro dela antes que termine.


O Som do Silêncio (Rosamund Lupton)
Jacarandá Editora
1ª edição - Fevereiro de 2016
296 páginas

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