segunda-feira, 27 de julho de 2015

Finalizar em grande

Depois de um começo que me suscitava dúvidas seguiu-se uma melhoria que me avivou o interesse para o final da trilogia.
A previsão que fiz a propósito deste livro revelou-se apenas metade ajuízada. Este tomo é, de facto, o mais interessante da trilogia mas, pelo contrário, Anders de la Motte está já bem perto de ser um escritor com domínio do seu labor.
A trilogia veio sempre em crescendo de ideias em vez de "espectáculo", o contrário do que é comum e precisamente o que se quer de uma boa saga.
Da dissipação de limites (morais) para o individualismo que o anonimato online permite chega-se agora à promiscuidade entre interesses privados e manipulação pelo Estado da informação dos cidadãos.
Um tema para o qual os alertas são cada vez maiores e que o autor não só integra na trama como o transforma num motivo global que se integra no percurso individual de Henrik Petterson.
Obviamente que um homem contra o "mundo" é uma imagem ainda exagerada no seu heroísmo, sobretudo porque não se reduz a uma acção de denúncia mas continua a depender de uma acção directa.
Acção cada vez menos significativa na trama, reduzida a um único grande evento. E essa é uma das situações em que uma adquirida sabedoria do escritor se faz notar.
O autor deu a HP parceiros na sua luta, fechando o círculo, pois são um grupo de indivíduos intentados em vingar o abuso que sofreram às mãos do Mestre do Jogo.
A sua discussão sobre o plano de acção leva-os a um ponto em que terão de ser dignos de um episódio de Mission: Impossible. E aí a ironia de HP desvia o grupo e o livro desse exagero.
Com menos cenas de acção, o livro dá-nos algo muito mais interessante, dúvida e tensão continuadas.
A paranóica crescente de HP transmite-se ao leitor pela forma como Anders de la Motte escreve. Ainda variando o ponto de vista entre HP e a irmã, é neste livro que essa variação funciona melhor pois as vozes estão cada vez mais definidas e o frenesim dele é contrariado pelo maior controlo dela.
É mesmo na última reviravolta da saga que a variação entre os dois pontos de vista tem o seu melhor desempenho, transmitindo uma dúvida que deixa o leitor em suspenso para conhecer o final do arco narrativo de Henrik Petterson.
Ele, claramente, evoluiu ao longo dos livros e a sua história pessoal recebeu o mesmo cuidado que os detalhes da trama sobre a aproximação de uma versão do big brother. Em parte foi necessário terminar a trilogia para concluir que o personagem era tão importante para manter o interesse como a inteligência dos meandros destes thrillers.
Meandros que o autor leva ao limite, fazendo malabarismo com muitas hipóteses e personagens mas conseguindo concluir o espectáculo sem deixar cair nenhuma. Une-as com lógica e eficácia e responde a todas as questões sem fechar por completo a porta a algumas sugestões que oferecem ao leitor algo para o acompanhar para lá do final.
Não se trata de deixar espaço aberto a uma sequela mais, apenas não negar ao leitor o prazer da reflexão.
Bolha é a devida recompensa para quem acompanhou toda esta história, tenha ou não aderido com ânimo desde a primeira folha. Quem chegou aqui não fica desapontado.


Bolha (Anders de la Motte)
Bertrand Editora
1ª edição - Abril de 2015
424 páginas

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