domingo, 9 de junho de 2013

A caminho do infinito

Os romances biográficos tendem a tentar explicar o biografado através dos resultados da obra que deixou no seu campo de trabalho.
Um exercício de psicologia barata que tenta simplificar em resultados a complexidade de uma vida inteira. Como se as características de personalidade que alguém revela no momento de concretização tivessem de se verificar em todos os momentos da vida.
Bullough orientou o seu trabalho de forma a percorrer episódios que, desde a infância, vão definindo o ser humano e o encaminham de forma consistente para que ele tenha a capacidade e a predisposição para concretizar uma visão.
Primeiro vem a pessoa, só depois os seus feitos. Uma pessoa caracterizada de forma sólida através de episódios esporádicos.
Episódios não insignificantes mas alguns de entre eles até de uma certa banalidade na visão global da vida de alguém.
Os leitores, pouco familiarizados com os pais do programa espacial Russo, são conquistados para a vida de Konstantin Tsiolovsky desde a sua infância, torcendo e sonhando com o que ele fará.
Sobretudo no contexto de uma Rússia desolada, um lugar que é o melhor ponto de partida para que Konstantin olhe para a distância, sobretudo em direcção ao céu, claro.
A dureza do cenário rural russo vem acompanhado de enorme beleza fazendo ver porque motivo Konstantin olha para horizontes distantes.
Não se trata de uma vontade de escape, mas uma vontade de partir levando consigo a pátria que é uma verdadeira mãe, causadora de sentimentos ambivalentes de amor e ódio.
A vida de Konstantin no cenário da URSS, talvez o único que pela sua extensão e rarefacção - humana e tecnológica - o poderia levar a alcançar as ideias para atingir o Espaço (algo que só 21 anos depois da sua morte seria feito), é descrita por Bullough com enorme rigor.
As imagens são sempre vívidas, procurando para as criar uma beleza na escrita que não negligencia a utilidade de cada palavra escolhida.
Em tão breve número de páginas que o livro tem - para aquilo que uma biografia romanceada poderia ter sido - tudo o que poderia ser excendentário foi retirado.
Uma economia que não deixa a sensação de que algo esteja em falta para concretizar um retrato rico que nos leva de um inóspito lugar sem perspectivas até ao sonho do Espaço desconhecido.
A vida recriada neste livro expande-se de um acidente na infância até ao sucesso (autodidacta) intelectual da idade adulta. Uma progressão tão extraordinária que parece pedir esse corolário óbvio, o alcance do Espaço.
A vida tão extraordinária por ser, em grande medida, tão simples, não chegou a concretizar para si mesma o momento de superação desse que parecia ser o irremediável limite físico de eternamente gravitar em torno da Terra. Mas conseguiu fazê-lo para todas as vidas que lhe seguiriam e partindo de tão modestas possibilidades.


A Magia das Estrelas (Tom Bullough)
Matéria-Prima Edições
1ª edição - Outubro de 2012
212 páginas

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