sábado, 4 de agosto de 2012

O último tabu

O sexo é tudo menos tabu entre a maioria da população, pelo menos desde que Sex and the City fez a sua aparição e granjeou sucesso. E dizendo sexo diz-se, também (e felizmente), a consciência saudável da sexualidade na sua multiplidade de escolhas e problemas.
Por isso já não é pela exposição cartoonesca do sexo que se torna provocatória, antes a utilização da mesma para chegar a alguns dos extremos a que estão submetidas as relações entre homens e mulheres, essas sim ainda uma fonte permanente de vergonhas, incómodos e dúvidas.
Esse é o verdadeiro tema dos dois livros que hoje por aqui passam, um recentemente lançado e o outro recuperado pela memória das similitudes que apresenta.
Enquanto o leitor supera o choque - ou a ideia do choque que uma etiqueta "Só para adultos" quer provocar - até ficar completamente à vontade com os desenhos, os livros vão ironizando com a ansiedade da performance, os comportamentos indecorosos e, acima de tudo, com as inseguranças e ideias imprecisas que se projectam no par.
Essa ironia devia, sim, chocar o leitor porque mais cedo ou mais tarde vai acertar com o seu caso - o seu erro? - particular.
Arthur de Pins é quem vai mais longe, brincando também com as próprias ideias impostas pelos conhecidos e pelos entendidos na matéria das relações e do sexo. Uma das histórias vai mesmo terminar culpando Os Homens são de Marte as Mulheres de Vénus pela transformação de um potencial sonho erótico de único homem num planeta de belas mulheres num pesadelo castrador (literalmente).
Mas o sintoma maior disso mesmo é o facto de Arthur de Pins usar recorrentemente um protagonista (e alter-ego?) de nome Arthur que acaba por dar azo a histórias que se tornam sequenciais e falam da evolução de uma relação até mesmo ao ponto em que esta se desfaz.
Zep não se desvia das pequenas histórias isoladas e foca mais o humor em muitos casos de "apanhado em flagrante" que deixam os protagonistas nas mais vexantes situações. Sendo muitos os casos em que a decisão final que os coloca nesse ponto é feita apenas em função do que se julga que o outro quer: uma mulher pede para ser insultada durante o sexo e sai porta fora ao ouvir "baleia" ou um homem lamenta o momento em que tentou acarinhar a mulher com quem está dizendo "Adoro fazer prut-prut contigo" depois de uma sessão de sexo com o que ela achava serem barulhos desconfortáveis.
O que está para lá do sexo é que complica as relações. A performance sexual causa mais ansiedade, mas é a performance emocional que prejudica mais casais. E é esta o verdadeiro alvo da mais descarada representação apesar do sexo ser o motivo principal dos desenhos.
Pequenos Prazeres e Happy Sex são ambos atrevidos - e no caso de Happy Sex é mesmo explícito - sem serem incómodos ou impúdicos.
Tudo porque o desenho de cada um inspira uma distanciação segura, misto de atração pelo animado efeito conseguido através das ferramentas escolhidas e uma desconsideração por uma ilógica visão de falta de seriedade (até infantilidade) do género de desenhos usados para representação do sexo.
Em Pequenos Prazeres são as ferramentas informáticas que tornam todas as personagens parcialmente indistintas, caricaturadas de forma simpática nas suas feições expressivas e providas de formas (no caso, sobretudo as femininas). Tudo sublinhado por uma escolha de cores vivas que proporcionam uma óptima sensação.
No caso de Happy Sex, as cores discretas - sobretudo em tons pastel - usadas para sublinhar as emoções dos momentos climáticos (humoristicamente falando, entenda-se) das suas diversas pranchas envolvem as personagens cujo realismo é minado pela caracterização exagerada da combinação dos elementos faciais que, assim, aligeiram ainda mais o realismo físico e situacional.
O leitor é solicitado a divertir-se pela marotice destes dois desenhos mas a visão dos seus autores não pretende desculpar as tolices que os seus personagens cometem por qualquer forma aligeirada de os representar.
Ei-nos perante o verdadeiro último tabu, saber como reagir ao sexo na nossa sociedade. Se estes livros forem parar às mãos dos adolescentes e não apenas dos adultos, talvez estes venham a evitar ser como algumas das personagens aqui retratadas que tiram as suas lições de filmes pornográficos.

 
Pequenos Prazeres (Arhtur de Pins)
Contraponto
1ª edição - Junho de 2012
176 páginas

 
Happy Sex (Zep)
Edições Asa
1ª edição - Setembro de 2010
64 páginas

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