quinta-feira, 24 de maio de 2012

Acção e intenção

Quem for ler David Baldacci pode contar com os elementos que tornam os thrillers leituras empolgantes: um herói solitário e misterioso, um interesse romântico com mais do que uma bela cara, um grupo dentro do qual egos chocam, cenários originais espalhados pelo mundo e momentos de acção para todos os gostos.
Cativante com os seus capítulos rápidos e diálogos duros, falta saber porque merece Baldacci ser publicado por cá quando, ao longo da lista dos mais vendidos do The New York Times, autores com esse conjunto de características são às dúzias.
São os importantes temas de fundo que respondem a essa pergunta, imperceptíveis a quem não quiser mais do que a vertigem da acção, mas fundamentais a quem quer encontrar uma reflexão literária da política mundial.
Aqui são as questões relativas à Justiça e a como essa justiça pertence apenas a quem tem a alavancagem certa para fazer valer os seus intentos. A Justiça, a sua validade e a permissividade com que é aplicada. Falo de uma Justiça capital baseada no entendimento (quase) universal do que é correcto.
O grupo que persegue, tantas décadas depois, os Nazis escondidos pelo mundo e, quando estes escasseiam, autores de crimes contra a Humanidade de outras nacionalidades e de outras Eras, acaba por ser a tradução literária do que afecta este tipo de Justiça.
Julgando-os e executando-os, o grupo faz valer a máxima de que os vencedores definem e manobram a Lei mas, também, que fazem valer actos ilegais através de uma chantagem sentimental por gerações a fim.
Isso traz à baila perguntas sobre temas que estão muitas vezes afundados num silêncio para descanso da consciência geral: os tribunais internacionais em que os países fundadores não permitem que os seus próprios soldados sejam julgados ou as atitudes bélicas de Israel que passam incontestadas.
Creio que se trata de uma tentativa de consciencialização do público - sobretudo o público Norte Americano - para o espectro mais complexo da política internacional. Uma tentativa feita com a habilidade que impede que essa intenção pedagógica se sobreponha a uma leitura voraz.
Não é este alerta - que pode passar despercebido ou ser mesmo contestado pela larga maioria dos leitores - que o thriller é contaminado ao ponto das suas segundas intenções o estragarem.
Por isso é que Baldacci tem alguma pertinência mais do que os thrillers que se constroem como meros exercícios de acção, servindo-nos através dos elementos do sucesso bases para pensar o mundo enquanto este continua a servir cenários para este género literário.


A Conspiração do Silêncio (David Baldacci)
Clube do Autor
1ª edição - Março de 2011
516 páginas

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